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Vitória
Comunidade acadêmica se manifesta contra o uso improvisado da EaD no contexto da pandemia

Comunidade acadêmica se manifesta contra o uso improvisado da EaD no contexto da pandemia

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Fernando R.
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Comunidade da Unesp
Comunidade acadêmica se manifesta contra o uso improvisado da EaD no contexto da pandemia.

Carta aberta aos alunos e a toda a comunidade da UNESP.


O planeta enfrenta uma situação inédita. O alto grau de mundialização propaga doenças como o Covid-19 que hoje atinge a sociedade em um momento de desarticulação de laços de solidariedade e de desmonte dos direitos sociais como nunca visto em outros períodos. A situação deixa a todos muito vulneráveis, a alguns mais do que a outros.

No caso de nós, docentes de Ensino Superior que subscrevemos este documento, a roda viva de pressões pela produtividade não nos oferece tempo para olhar com o distanciamento necessário que as situações graves exigem. A tendência, por inércia e alienação, é continuar a produzir, produzir e produzir, mantendo uma normalidade que neste contexto se revela artificial, ou mais grave ainda, como um autoengano passivo e contagioso.

Alguns estudantes estão mais vulneráveis ainda. Muitos deles são trabalhadores informais que precisam decidir entre evitar o contágio (dos outros, da família e deles próprios) e obter meios de sustento sob condições trabalhistas extremamente precárias. Esta situação explicita com dramaticidade a fragilidade das propostas empreendedoristas que tentam camuflar as escolhas de organização do trabalho no Brasil e no mundo.

Neste contexto, o discurso sobre EaD vem ganhando várias faces, até mesmo as mais apelativas apoiadas nos aspectos afetivos das relações universitárias, propagando a intenção de “manter o contato com os alunos”, por exemplo, aproveitando-se do nosso desejo compreensível de encontro e superação do isolamento social tão necessário quanto sofrido. No entanto, essa chamada apelativa oculta o velho apelo à produtividade sem limites, chamando-nos a ações redentoras e compensatórias.

A excepcionalidade das circunstâncias e um cenário de incertezas e ansiedades fortalecem essas ações que aparentemente se apresentam como alternativas imediatas e viáveis, mas que vêm sendo gestadas há tempos e que poderão se concretizar em um futuro, adquirindo materialidade e se estabelecendo como novas formas de trabalho, pautadas pela precariedade, alienação e desumanização.

Além disso, todos nós, alunos, docentes e técnico-administrativos, assim como a sociedade em geral, estamos vivendo um momento de extrema tensão, em que nossos medos tomam a mesma dimensão dos novos e necessários cuidados. Assim, o contato com estudantes, colegas, vizinhos, parentes e amigos, nesta hora difícil, é um gesto humano e não uma exigência profissional para nos garantir o cumprimento das tarefas cotidianas nas universidades que têm como um dos principais - embora empobrecidos - objetivos o preenchimento quantitativo de nossos “currículos Lattes”. Não nos enganemos! A preocupação com as propostas de continuidade das atividades de ensino na modalidade à distância que nos oferecem neste período mais do que especial é o cumprimento dos conteúdos das disciplinas, objetivando “aproveitar o tempo”. Ora, o tempo de todos nós da comunidade universitária está agora preenchido em primeiro lugar com as preocupações e com os cuidados individuais necessários ao isolamento, também com os cuidados afetivos com nossas famílias e amigos, cuidados com o contágio coletivo em nossas comunidades, ou seja, com os cuidados e preocupações conosco e com o mundo que sofre tão inesperada e agressivamente com essa pandemia. Muito se tem falado em preencher o tempo, mas nosso tempo está preenchido, psicológica e pragmaticamente por aquilo que nos mobiliza e nos ameaça, a própria pandemia.

A EaD seria, neste momento, uma alternativa equivocada do ponto de vista pedagógico, pois implica em dispêndio de energias de estudantes e professores, quando a gravidade das circunstâncias exige vigor e concentração de esforços. Que fundamento pedagógico nos apoia para colocarmos os estudantes sob maior pressão, visando a responder a uma demanda de aulas e atividades em condições muito inapropriadas, somando a isso o estresse do cotidiano excepcional, ao qual ainda ninguém de nós conseguiu se adaptar? Além disso, as diferenças entre os ritmos e formas de aprendizagem entre os alunos, que as atividades presenciais em salas de aula procuram minimizar, neste momento tão excepcional se agravarão, pois essa modalidade de ensino não se restringe ao acesso às tecnologias, embora ele próprio seja diferente para os diferentes alunos. Manter o calendário, nessas circunstâncias, pouco contribui com tudo aquilo que significa um processo de ensino e de aprendizagem, incluindo o cuidado afetivo com nossos estudantes. O que parece uma proposta de ensino de qualidade “ante a situação excepcional”, anuncia resultados pedagógicos capengas para aqueles que podem acompanhar as aulas e um aumento desnecessário e inapropriado de tensões, medos e angústias.

A UNESP, é preciso reconhecer, teve o cuidado de oferecer EaD como opção aos docentes de seu quadro. Tal autonomia aparece subsumida nas inúmeras recomendações, orientações, formações, exemplos, recursos tecnológicos e humanos e diversas outras alternativas anunciadas como supostas formas eficazes de incorporação das atividades EaD ao ensino de Graduação, Pós-Graduação e Pesquisa. Entretanto, para não cairmos na armadilha imediata daquilo que parece óbvio, caberia indagar o que EaD significa do ponto de vista do trabalho docente. Convidamos nossos alunos e docentes a refletir sobre alguns aspectos importantes:

  • Essas alternativas, apresentadas para “livre” escolha dos professores, levam em conta as características e condições de trabalho educativo ou se limitam a forçar um ar de normalidade frente a uma situação completamente excepcional?
  •  Essas condições, mesmo preservando a autonomia de decisão docente, garantem as mediações humanas presenciais ou tornariam ainda mais precárias as relações de trabalho?
  • Ao aderir às atividades de ensino na modalidade EaD estamos levando em conta o caráter excepcional que a pandemia impõe a toda comunidade universitária?
  • Com essas propostas, estamos considerando que muitos de nós estão isolados das suas famílias, com responsabilidades inesperadas e acumuladas sobre seus filhos e outros familiares, eventualmente até doentes? 
  • Compreendemos que a EaD sobrecarregaria o trabalho de alunos e mães e pais docentes com tarefas extras e não previamente planejadas frente à demanda de tempo que essas responsabilidades familiares supõem?
  •  Estamos levando em conta que a EaD exige um tempo muito grande de preparação do material de aula e de acompanhamento dos alunos na tentativa de estar à altura, comparativamente, das inúmeras possibilidades que a aula presencial apresenta? 
  • Estamos considerando o esforço em dominarmos tecnologias que não nos são familiares, senão como apoio às aulas presenciais, tudo isso quando as solicitações de cuidado se ampliam consideravelmente?
  • Estamos considerando que, em muitos casos, os docentes e técnicos administrativos nas universidades estão voltados para atender a demandas de pesquisa e extensão cujas áreas de conhecimento contribuem para a defesa da população no enfrentamento da pandemia?
E há realmente uma série de atividades nas quais algumas áreas da universidade podem se engajar, no âmbito da pesquisa e da extensão. Não como parte da rotina habitual da instituição, mas como um esforço excepcional de contribuição e enfrentamento da pandemia. As áreas de saúde, por exemplo, das unidades de Araraquara, estão produzindo álcool em gel e testes para diagnóstico do Covid-19. A Geografia de Presidente Prudente está montando um mapa dinâmico para monitorar a expansão do contágio. Não são atividades da normalidade, como se nada acontecesse, mas respostas à situação excepcional.

Diante de tantas indagações e incertezas, nós que assinamos esta carta somos comprometidos com uma educação de qualidade, e nesse momento isso significa estar solidários com as nossas comunidades que se esforçam mais do que nunca para superar a ameaça do Covid-19. Para nós, garantir o encerramento do semestre letivo na UNESP não é, definitivamente, prioridade no momento mais grave entre os que temos vivido no Brasil e no mundo.


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